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segunda-feira, 1 de julho de 2013

Brasil “professor” dá aula ao “aluno” Espanha

 
POR BOB FERNANDES, DIRETO DO RIO DE JANEIRO
 
Dezoito de dezembro de 2011, Tóquio. Com um 4 a 0, o Barcelona de Xavi, Iniesta, Pique, Messi & Cia atropela o Santos de Neymar e é campeão do mundo. Pepe Guardiola, técnico do Barça, com alguma ironia e ar professoral explica o resultado acachapante:
 
-…o Barcelona toca a bola, como meu pai falava que vocês brasileiros faziam…
A escola espanhola havia superado a escola brasileira, os alunos superavam os professores.
 
Domingo, 30 de junho de 2013, Rio de Janeiro. Brasil 3, Espanha 0.
 
A seleção de Neymar, Paulinho, Fred & Cia toca a bola, de pé em pé, ganha a Copa das Confederações pela quarta vez, a terceira consecutiva, e mais de 70 mil  extasiados torcedores entoam gritos e cânticos no Maracanã:
 
-Olé, olé, olé…
 
-O campeão voltou, o campeão voltou…
 
-Quer  jogar? Quer jogar? O Brasil vai te ensinar…
 
Numa noitada excepcional, o Brasil retoma o posto de professor. Até que venham a Copa 2014, a Alemanha, Itália, Argentina e a própria Espanha, o time de Felipão reassume o papel que viveu nos último 55 anos: o de um dos grandes favoritos numa Copa do Mundo.
 
Felipão Scolari, também ele saudado em coro no Maracanã, sabe os riscos de tal favoritismo pós- Copa das Confederações. Risco, e naufrágios, já experimentados pelo Brasil, em especial na Alemanha e África do Sul.
 
Uma hora depois da partida, a cautela de Felipão diante da vitória espetacular:
 
-… permite sonhar com um caminho, sonhar com um time para estar entre os melhores na Copa…provamos que temos um time para brigar com outros times do mundo…
 
Com a sinceridade habitual, o técnico avisa que as portas da seleção “estão abertas”, que o grupo não está fechado, como remoe o jargão de boleiros e jornalistas boleiros e deixa escapar o que, hoje antevê, calcula, imagina até a Copa:
 
-… temos setenta por cento, oitenta por cento da equipe…a gente não prometeu que seja esse grupo (todo) eu não escondi isso deles…
 
Para não deixar dúvidas, a brincadeira num diálogo com Neymar, à mesa com Felipão na entrevista pós-jogo.
 
Neymar diz esperar fazer “uma ótima Copa” em 2014, e Felipão, como se não estivesse sendo captado pelos microfones, provoca:
 
-… não se esqueça que quem convoca sou eu…
 
Neymar tabela:
 
-… já tô me escalando, professor…
 
Nos sites dos jornais espanhóis, e não apenas, a escalada de Neymar e da seleção brasileira:
 
-Neymar impõe seu futebol de vertigem – bradou o “Sport”, da Espanha, numa das suas manchetes.
 
-Neymar aplastra La Roja (a Espanha), titulou o “Mondo Deportivo”, que ainda diria: 
-Neymar dá Confederações ao Brasil.
 
“O “Marca”, valeu-se da derrota de 1950 e de um sinônimo para o atropelamento: “Maracantazo”, “Neymarazo”, e “Inferno no Maracanã”.
 
O “As” da Espanha lamentou:
 
-O melhor Brasil e a pior Espanha.
 
O “Terra” da Espanha foi pelo mesmo caminho:
 
-Brasil devora a pior Espanha.
 
Sem querer render-se de todo, saca reclamações de Xavi e Iniesta contra as faltas cometidas pela seleção brasileira e diz em outro título:
 
-O “jogo feroz” do Brasil devora uma Espanha apática.
 
O italiano La Gazzetta dello Sport foi na ferida:
 
-Show de Fred e Neymar / O Brasil afunda a Espanha.
 
O argentino Olé, lembrando das ruas e avenidas do Brasil nestes dias e do gol de Neymar sapecou:
 
-Manifestação de Futebol.
 
O Olé saudou ainda o golaço de Neymar:
 
- Pé Esquerdo Maravilha.
 
Felipão não escondeu quem o ajudou na aula. Gallo, treinador das seleções de base, seguiu os espanhóis e apontou pontos fracos e fortes. Jogadores e jornalistas portugueses mandaram observações do amistoso Portugal 4, Espanha 0.
 
Em resumo, além do gol relâmpago de Fred logo aos 2 minutos, uma das chaves da vitória foi o adiantar a marcação, a pressão na saída de bola.
 
Desde o início, de outra forma, mas com o mesmo espírito da Itália na semifinal, ao obrigar o goleiro Casillas a dar chutões e, assim, interromper o fluxo que permite a Xavi e Iniesta fazer rodar o carrossel de triangulações da Espanha.
 
Júlio César sai da Copa das Confederações de volta ao patamar em que estava até  a desastrosa tarde do Brasil 1, Holanda 2 na Copa do Mundo. O de um grande goleiro. Defesa decisiva no pênalti contra o Uruguai, grande partida na final.
 
Daniel Alves. Certamente por imposição tática subiu pouco contra a Espanha, mas seja por cansaço de fim de temporada ou por um motivo qualquer, jogou uma Copa irregular. Talvez por isso suas críticas à mídia brasileira e elogios à da Espanha.
Um equívoco de Daniel, os elogios ao todo do reportariado espanhol. Vários deles vestem, literalmente, a camisa da seleção.
 
Mais do que os gritos de gol, humanos e muitas vezes inescapáveis, alguns dos jovens repórteres elogiados por Daniel assistem às partidas, na tribuna de imprensa, com camisas vermelhas, como se fossem torcedores.
 
E narram, ou deixam de narrar fatos, como se fossem torcedores e nada além.
Ao final dos 3 a 0, e antes de seguir para a sala de imprensa e entrevistas, pelo menos um deles, em plena tribuna, tirou a camiseta da Roja e fantasiou-se de jornalista.
 
No Brasil x Uruguai, à frente da nossa bancada um exemplo de até onde o jornalismo-torcida pode ir quando contamina também as narrativas.
 
Brasil 1, Uruguai 0. Na tela do repórter espanhol, página e titulo já desenhados: “O Brasil espera a Espanha”. Detalhes: era apenas o final do primeiro tempo, e a Espanha a ainda enfrentaria a Itália. No dia seguinte.
 
Gol de Cavani, Uruguai 1, Brasil 1, no início do segundo tempo. O jornalista-torcedor, de imediato muda a manchete, evoca o Maracanazo: “O Brasil volta a chorar”. Paulinho desempata no final, e meia volta volver no título do jornal:
 
-O Brasil espera a Espanha.
 
Tiago Silva. À exceção da bobeira no gol de empate do Uruguai, uma grandiosa Copa.
 
David Luiz. Como definido por Felipão, protagonizou o momento decisivo do Brasil x Espanha:
 
-O momento da vitória foi o do David Luiz (ao salvar, quase em cima da risca, o gol espanhol) decisivo foi aquele lance, não o primeiro, o segundo ou o terceiro gols…
E foi mesmo. Na memória do torcedor inebriado, aquele carrinho salvador apaga tudo, mas certamente Felipão e Parreira conversaram com o zagueiro sobre o pênalti em Lugano, ápice dos não poucos momentos de afobação e excessos.
Marcelo. Outro com uma grande Copa. Em boa parte dos jogos, muito mais um meia do que um lateral. Como no início da jogada do terceiro gol do Brasil, o segundo de Fred contra  Espanha.
 
Luiz Gustavo e Paulinho. Neste domingo, e durante os cinco jogos, enorme evolução como dupla. Grandes partidas de Luiz, excepcional a Copa de Paulinho, impecável no jogo contra a Espanha.
 
Paulinho foi eleito o terceiro melhor jogador do torneio, mas, a contar-se a final, merecia ao menos um degrau acima. No domingo conseguiu a proeza de fazer Iniesta parecer menos grandioso do que é.
 
Hulk. Marca, atropela, corre, cobre a subida dos laterais, ora à esquerda, ora à direita quando lá está. Iniciou a jogada do primeiro gol, participou na do terceiro, fez na final a sua melhor partida… mas tem um probleminha.
 
A jogada do gol que David Luiz evitou começa com uma bola que, lá na frente, Hulk não conseguiu dominar. Ao longo da Copa, por muitas vezes isso se deu: o desentendimento entre Hulk e a bola.
 
Nas vitórias, a torcida reconhece a extraordinária dedicação de Hulk à equipe. Mas para alguém que veste, e no ataque, a camisa amarela, aprender a dominar a bola é imprescindível. Ainda é tempo. Sempre há tempo.
 
Oscar. Um belo passe para Jô no terceiro contra o Japão. Outro precioso toque para Neymar no segundo contra Espanha. Muita luta, muita marcação, mas, pareceu, muita timidez.
 
Ou por seu jeito algo retraído, ou por imposição tática, Oscar deu a impressão de ainda não ter encontrado o espaço ideal.
 
Fred. Mesmo participando como garçom, servindo gols, jogava excessivamente fixo na função de definidor no início da Copa. Cresceu e muito além do papel de pivô/e/ou matador.
 
Artilheiro, ao lado do meia boca Fernando Torres, Fred brilhou na semifinal, ganhou a torcida de vez, arrebentou na final e carimbou o passaporte para a Copa. Só uma temporada infeliz, ou o destino, podem tirá-lo de 2014.
 
Neymar. Há menos de um mês, boa parte do país que gosta de espezinhar seus ídolos o contestava. Vaias nos amistosos, recordemos. E antes disso, vaias de quase todas as torcidas nas partidas do Santos.
 
Como se, aos 21 anos, Neymar já não tivesse feito o que já fez e vencido o que já venceu. Ou, talvez, por isso mesmo. No Brasil o sucesso alheio é ofensa pessoal, ensinou Tom Jobim.
 
Eleito o melhor jogador da Copa. Mas não apenas isso. Na hora em que são necessários os grandes, Neymar mostrou sua dimensão. Como craque fora de série e como alguém capaz de suportar pressões cada vez maiores.
 
No domingo, não apenas o golaço e o corta-luz no terceiro gol. O passe milimétrico para o gol de Fred que Casillas evitou no primeiro tempo, o atrair uma fila de marcadores a cada lance e cada jogo.
 
Neymar brilhou na Copa. Dos estádios Mané Garrinha, Castelão, Fonte Nova, Mineirão e Maracanã, Neymar saiu consagrado pela torcida. Com seu nome entoado em coro. Agora, o Barcelona.
 
De quem entrou: Dante foi muito bem contra Itália. Hernanes, com atuações seguras e confirmação da sua versatilidade, é outro que por ora cavou vaga na Copa.
 
Lucas. Sempre pedido pela torcida, não entrou bem em duas das partidas. Na quarta, Felipão optou por aquele que é, seguramente, uma de suas apostas para 2014, Bernard, que superou com sobras a prova de fogo contra o Uruguai.
 
Felipão sonha com ter encontrado um caminho para permanecer no topo em 2014. A seu lado, Parreira, certamente escaldado pelas derrotas, mas também vitórias.
 
Em 2005, dirigia o Brasil na vitória espetacular contra a Argentina, o 4 a 1 na final da Copa das Confederações. Um ano antes do naufrágio na Alemanha.
 
Doze anos antes, no mesmo Maracanã, Brasil 2, gols de Romário, Uruguai 0. No desfecho das eliminatórias, uma das maiores partidas da história da seleção. Um ano antes da Copa  que levaria ao tetracampeonato. 

terra.com

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