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Foto: Gerson Walber / Correio do Estado |
Segundo o urologista, se o tumor é restrito à próstata, normalmente existe 90% de chances de cura |
A exemplo do que aconteceu em outubro, marcado como o mês de combate ao
câncer de mama, com o ‘Outubro Rosa’, o mês de novembro chega trazendo a
campanha de conscientização dirigida ao público masculino, sobre a
importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de próstata.
Nesta entrevista, o presidente da Sociedade Brasileira de Urologia -
Seccional MS, André Luís Alonso Domingos, fala a respeito da campanha de
conscientização para que o homem procure o médico e faça seus exames
regularmente, após os 40, 45 anos; sobre o funcionamento de um centro
específico para o homem na Capital e sobre o diagnóstico e tratamento da
doença.
CORREIO PERGUNTA A exemplo do “Outubro Rosa”, foi criado o
“Novembro Azul”, ligado à prevenção do câncer de próstata. Quais as
ações que estão sendo feitas diretamente junto à população para
conscientização dos homens em MS?
André Luís - Campo Grande é uma das cidades no Brasil
onde há o Centro de Referência de Atendimento ao Homem, próximo à
Unidade Básica de Saúde (UBS) do Coronel Antonino, que funciona há mais
de quatro anos. E, além disso, há o Centro de Especialidades Médicas
(CEM) – e aqui eu estou falando no nível de saúde pública. Qual é o
correto para o Sistema Público de Saúde? O paciente vai à UBS, faz uma
consulta com o clínico geral e, se ele tem critérios de indicação para
passar com o urologista, para prevenção do câncer de próstata, será
encaminhado tanto ao CEM quanto ao Centro de Atendimento do Homem. Neste
local, estão estritamente urologistas; no CEM , ele também é
encaminhado para a urologia do local. E, a partir daí, faz um exame –
não precisa ir para um hospital para fazê-lo. Normalmente, o médico da
UBS pede o PSA – que é o exame de diagnóstico inicial – e quando vai
para o Centro de Saúde do Homem ele já está com este exame, com todo o
histórico, e o médico faz a entrevista e realiza o toque retal.
Vamos distribuir panfletos em consultórios médicos, no Centro de Saúde
do Homem, também. E haverá cartazes para conscientização nas UBS.
Em quantos municípios de MS existe este Centro de Atendimento à Saúde do Homem?
Eu acredito que apenas em Campo Grande.
Então, este “Novembro Azul”, no caso de Campo Grande, veio apenas para reforçar a necessidade da prevenção?
Isso, trata-se de uma campanha mais de conscientização da população,
para que os homens procurem o atendimento e façam uma prevenção do
câncer de próstata. Na verdade, o termo prevenção não é muito correto.
Porque prevenção é quando você, por exemplo, toma uma vacina que evita
que você tenha a doença. É para que o homem venha precocemente ao
urologista e, se ele tiver alguma coisa, seja detectada numa fase
inicial, na qual temos chance muito maior de cura.
No Brasil, o câncer de próstata é o segundo mais comum entre os
homens, atrás do câncer de pele. O senhor sabe me dizer quantos casos
foram registrados em MS neste ano e o número de óbitos pela doença?
Os números existentes são divulgados sempre pelo Inca (Instituto
Nacional do Câncer). Para o Brasil, no ano de 2012, estimaram-se 60.180
casos novos de câncer de próstata. Esses valores correspondem a um risco
estimado de 62 casos novos a cada 100 mil homens. Na região
Centro-Oeste, depois do câncer de pele, é o mais frequente (75/100 mil).
Esta é a última estatística disponível.
O número de óbitos pela doença é grande?
O que ocorre hoje é que o câncer de próstata é o segundo tumor mais
frequente em homens. O primeiro é o de pele, mas, se você desconsiderar
este, que tem muito tumor benigno, o câncer de próstata é o que mais
acomete os homens. E se você comparar o câncer de próstata com o de
mama, a incidência para o câncer de próstata para 2014 é maior do que o
de mama. E muito menos divulgado.
Quando é detectado no início, quais as chances de sobrevivência?
Se o tumor é restrito à próstata, normalmente nós temos em torno de 90% de chances de cura. Apenas com tratamento.
Ele evolui rapidamente ou é mais lento?
Dos tumores urológicos, ele é o de crescimento mais lento, diferente de
um tumor de testículo ou de rim. Isso não quer dizer que o paciente não
possa morrer pela doença. Porque, como ela dá poucos sintomas, o
paciente não sente que está com o tumor, ele vai tendo crescimento
lento. Se o paciente não procura o médico, no momento em que ele tem o
sintoma, o tumor já está numa fase em que o tratamento é mais difícil de
ter sucesso. Oitenta por cento dos tumores de próstata não dão
sintomas, já que estão na periferia da próstata, e não no meio dela,
onde atrapalharia o indivíduo ao urinar – isso aconteceria mais na fase
final do tratamento. Até o tumor chegar ao canal da urina, demora. Por
isso, são necessários os exames, para que se possa fazer o diagnóstico o
mais precocemente possível.
Esta pode ser considerada uma doença apenas da terceira idade? Quais são os fatores de risco?
Os principais fatores de risco são a idade – quanto mais velho o
paciente, mais chance dele apresentar o problema. O ideal é que os
exames comecem a ser feitos a partir dos 40 anos. Mas a idade,
normalmente, mais frequente, é a partir dos 70. Porém, eu já operei
pacientes com 45, 50 e 60 anos. Além disso, os fatores de risco: a raça
negra é um, muito importante, além do consumo de gordura saturada (de
origem animal). E o histórico familiar também entra nestes fatores de
risco. Destes todos aqui, a gente só pode modificar o consumo de gordura
saturada, por isso, a importância de se procurar com antecedência o
médico.
Este tumor é sempre maligno?
Todo tumor, câncer de próstata, é maligno. Toda vez que nos referimos a
tumor de próstata, estamos nos referindo à neoplasia maligna do local.
Para ser benigno, tem outra nomenclatura: hiperplasia benigna da
próstata (HBP).
Há sintomas? Quais e em qual momento?
Podemos dizer a dificuldade para urinar, sangramento na urina e, às
vezes, numa fase mais avançada, a dor óssea, como a dor na coluna .
Porque o principal ponto de metástase, de disseminação do câncer de
próstata, é a coluna vertebral.
Parece que o homem cuida mais de seu carro do que da própria
saúde. Por que há tanta resistência masculina em fazer o exame para a
prevenção?
Isso é uma verdade, mas nos últimos 5 a 10 anos isso vem mudando,
porém, ainda não de maneira satisfatória. Há uma pesquisa de 2009, feita
pela USP junto a outro pesquisador, mostrando que apenas 33% dos homens
procuram fazer exames de prevenção. E a gente acha que vários fatores
contribuem para a baixa procura: um deles é a falta de informação – e aí
a imprensa e a sociedade têm grande papel nisso, como o “Novembro
Azul”. E, ainda, o próprio preconceito machista que existe na sociedade,
de que homem não pode fazer toque retal. Este é um exame indolor, muito
rápido de ser feito. E, normalmente, eu não tenho dificuldade alguma em
fazer o exame em todos os pacientes que vêm ao meu consultório e a quem
eu explico a real necessidade de fazer o toque.
O senhor poderia explicar qual a sequência de exames feita até o diagnóstico?
Em teoria, o exame de toque é complementar ao exame de PSA e
vice-versa. Eles são exames complementares, não que se excluem. Não está
correto o médico fazer apenas o exame de PSA, mesmo que ele esteja
normal, porque há casos em que é apontada a normalidade e aí se detectam
nódulos no toque retal – e este paciente tem indicação de biópsia
prostática também. Na verdade, o diagnóstico não é feito com PSA e com
exame de toque, são exames de rastreamento. A biópsia é que vai mostrar
se é tumor maligno ou não. Então, PSA alterado ou que evoluiu muito
rapidamente no último ano, bem como nódulo no toque retal na próstata
são indicações para biópsia de próstata.
A retirada do tumor maligno influencia posteriormente na potência masculina?
Pode influenciar. Hoje, com as técnicas mais apuradas nos procedimentos
cirúrgicos e da preservação da enervação do pênis na cirurgia, é menor.
Porque o feixe que enerva o pênis, responsável pela ereção, passa por
baixo da próstata. E quando você retira este órgão, às vezes, pode haver
dano a este tipo de nervo. Ocasionalmente, ele é difícil de ser
visualizado. Pode ser que o tumor tenha se estendido um pouco fora da
próstata e não se pode preservar o nervo. Mas, hoje, com as técnicas de
preservação do nervo, aumentaram-se as chances de o indivíduo ficar
potente. Mas ainda existe este risco da impotência. E quanto mais idoso
for o paciente que vai para a cirurgia, maior a chance de impotência.
Porém, é preciso explicar que, mesmo que isso ocorra, há vários tipos de
tratamento que promovem a ereção.
O que o senhor acha que é ideal para atrair os homens a frequentar os Centros de Atendimento ao Homem?
Em primeiro lugar, tem que haver uma política pública de facilitar o
acesso desta população ao urologista. Depois, é preciso ter uma rede
para se fazer as biópsias adequadamente. E, por fim, precisa-se de
centros que possam fazer o tratamento deste paciente, caso ele tenha o
câncer de próstata: seja ele um tratamento cirúrgico ou, por exemplo,
uma radioterapia.
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