Em Kepler-78b, o pôr do Sol é gigante. Imagine uma estrela a ocupar
metade do céu entre o horizonte e o zénite. E ainda rochas fundidas à
superfície devido a temperaturas muito altas. Kepler-78b gira a uma
distância mínima do seu sol e completa uma volta em apenas 8,5 horas.
Está tão perto daquela estrela que os astrónomos consideraram que
pertence a uma nova classe de planetas. É um mundo quente, infernal, o
oposto da nossa realidade amena, e incompatível com a vida que
conhecemos. E, no entanto, duas equipas de astrofísicos fizeram,
separadamente, medições deste exoplaneta e descobriram que, das centenas
que já se conhecem, o Kepler-78b é o mais semelhante à Terra no
tamanho, na massa e na densidade.
Os artigos com os resultados das duas equipas são publicados nesta quarta-feira na edição online da revista Nature. Uma das equipa inclui um investigador português Pedro Figueira.
Por
onde começar a procurar vida noutros planetas? Os astrofísicos
gostariam de começar essa procura em sítios com as características do
nosso mundo. O ideal seria mesmo encontrar um planeta-irmão da Terra, de
tamanho e massa semelhantes, a girar à volta de uma estrela com
dimensão e idade equivalentes à do Sol e na mesma zona de
habitabilidade. Ou seja, suficientemente perto da sua estrela para o
calor impedir a água de congelar, mas não tão perto que a fizesse
evaporar-se para o espaço.
Mas até agora, ainda não encontraram a Terra número dois.
Desde
1995, quando se descobriu o primeiro planeta fora do nosso sistema
solar, já se identificaram com certeza perto de 1000 exoplanetas. Alguns
deles aproximam-se daquilo que os cientistas procuram. Há exoplanetas
que são super-Terras, têm duas a dez vezes a sua massa, alguns estão em
regiões onde pode haver água líquida. Há outros têm massa equivalente à
da Terra, mas situam-se em regiões que se adivinham mortas.
Ninguém
está à espera de encontrar vida em Kepler-78b. Quando foi noticiada a
sua descoberta, em Agosto deste ano, sabia-se pouco: estava a 700
anos-luz de distância, na constelação do Cisne, girava em redor de uma
estrela um pouco mais pequena do que o Sol, completando uma volta em 8,5
horas. Mercúrio, a 58 milhões de quilómetros do Sol, demora 88 dias.
Agora,
a equipa norte-americana liderada por Andrew Howard, da Universidade de
Manoa, no Havai, e a equipa internacional liderada por Francesco Pepe,
da Universidade de Genebra, na Suíça, — com quem colaborou Pedro
Figueira, do Centro de Astrofísica da Universidade do Porto (CAUP) —
obtiveram novas informações que permitem perceber como este planeta é
especial.
Este exoplaneta, segundo as duas equipas, tem entre 1,69
e 1,87 vezes a massa da Terra e entre 1,2 e 1,16 vezes o seu tamanho.
Estas duas medições permitem inferir que a sua densidade é muito
semelhante à do nosso mundo, o que permite afirmar que é um planeta
rochoso. É o mais próximo que temos de um duplo da Terra, até agora.
“É
um planeta do tipo da Terra porque é do mesmo tamanho e tem a mesma
massa, mas claro que é diferente da Terra ao ter mais 2000 graus de
temperatura”, diz, em comunicado, Josh Win, astrofísico do Instituto de
Tecnologia do Massachusetts e membro da equipa de Andrew Howard. “É um
passo em frente no estudo de verdadeiros planetas como a Terra.”
Os
dois grupos de cientistas serviram-se da informação do telescópio
espacial Kepler para conseguir obter a informação sobre o tamanho do
planeta. Este telescópio da NASA, dedicado a identificar planetas
extra-solares, deixou de funcionar este ano. Tinha uma câmara que
fotografava milhares de estrelas, para medir variações na sua
luminosidade associada à passagem de um planeta à frente de uma estrela.
Quando tal acontece, a estrela fica com uma sombra mínima e o brilho
diminui, o que denuncia essa passagem.
De seguida, os cientistas
mediram a massa do planeta. Para isso, a equipa de Andrew Howard usou o
espectrómetro HIRES instalado num dos telescópios Keck, no Havai, e a
equipa de Francesco Pepe, fez as suas observações com o HARPS-N, um
espectrómetro para caçar planetas instalado no Observatório de
Muchachos, em La Palma, nas Canárias, Espanha.
Para se obter a
massa do planeta, foi necessário medir o efeito gravítico que Kepler-78b
tem na estrela. Esse efeito provoca uma oscilação na estrela, cuja
reverberação é captada nas ondas de luz que chegam àqueles
espectrómetros.
Segundo o CAUP, o trabalho de Pedro Figueira foi
importante para aumentar a sensibilidade destas medições. De outra
forma, seria impossível chegar a estas conclusões sobre um planeta tão
próximo de uma estrela. Aliás, o Kepler-78b faz parte de um novo grupo
de planetas com um período ultracurto de movimento em torno da sua
estrela.
Mas esta descoberta também aproxima a comunidade
científica do sonho de encontrar uma Terra numa zona propícia para a
vida. Com este novo grau de sensibilidade, é possível pensar em
identificar planetas com as dimensões da Terra, mas mais distantes de
estrelas que sejam mais pequenas e frias do que o nosso Sol, e na zona
de habitabilidade desses sistemas, sugere Drake Deming, num artigo de
análise sobre estas novidades, também da Nature: “Desta forma, a descoberta de Kepler-78b faz pressupor um avanço na procura de vida para lá do sistema solar."
publico.pt
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