O Tribunal Superior Eleitoral tirou do
Ministério Público o poder de pedir a instauração de inquéritos
policiais para investigação crimes nas eleições deste ano. A partir de
agora, promotores e procuradores terão de pedir autorização à Justiça
Eleitoral para abrir uma apuração de suspeita de caixa dois, compra de
votos, abuso de poder econômico, difamação e várias outras práticas.
Até a eleição de 2012, o TSE tinha
entendimento diferente. As resoluções anteriores que regulavam as
eleições diziam: "o inquérito policial eleitoral somente será instaurado
mediante requisição do Ministério Público ou da Justiça Eleitoral".Para
o pleito de 2014, os ministros mudaram o texto: "o inquérito policial
eleitoral somente será instaurado mediante determinação da Justiça
Eleitoral".Ou seja, o Ministério Público foi excluído.
O relator da nova norma, ministro José
Antonio Dias Toffoli, que irá assumir o comando da corte em maio, afirma
que o tribunal mudou o entendimento histórico por duas razões:
processos que não tinham o aval inicial da Justiça estavam sendo
anulados; outra razão, garantir maior transparência. "O Ministério
Público terá que requerer à Justiça. O que não pode haver é uma
investigação de gaveta, que ninguém sabe se existe ou não existe.
Qualquer investigação, para se iniciar, tem que ter autorização da
Justiça", diz. "A polícia e o Ministério Público não podem agir de
ofício."
O atual presidente do tribunal, ministro
Marco Aurélio Mello, foi o único contrário à restrição na corte ao
considerar que "o sistema para instauração de inquéritos não provém do
Código Eleitoral, mas sim do Código Penal, não cabendo afastar essa
competência da Polícia Federal e do Ministério Público."
O presidente da Associação Nacional dos
Procuradores da República, Alexandre Camanho, afirmou que a medida é
inconstitucional. "Se o MP pode investigar, então ele pode requisitar à
polícia que o faça. Isso também é parte da investigação", afirmou. A
associação não descarta ingressar com medida judicial para derrubar a
norma.
A nova regra, válida apenas para as
eleições de 2014, foi publicada no Diário de Justiça no dia 30 de
dezembro e aprovada pelo plenário em sessão administrativa 13 dias
antes. O site do TSE divulgou a aprovação da norma à meia noite e vinte
do dia 18 de dezembro. Neste ano, serão eleitos presidente da República,
governadores, senadores, deputados federais e estaduais.
Para o ministro Dias Toffoli, a medida não
irá atolar os juízes eleitorais de processos. "A Justiça nunca faltou."
Às vésperas da eleição de 2012, contudo, o TSE ainda analisava cerca de
1.700 processos referentes a eleição de 2008, mais da metade de
corrupção eleitoral. A Procuradoria Geral da República informou que não
tem um levantamento de quantos desses processos foram instaurados por
iniciativa do Ministério Público.
A Polícia Federal também protestou quanto a
medida. Para a instituição, contudo, a regra já vale há mais tempo. Em
audiência pública no TSE, realizada no ano passado, o delegado Célio
Jacinto dos Santos sugeriu que fosse permitido ao órgão abrir inquérito
sem a necessidade prévia de requisição ao Ministério Público ou à
Justiça Eleitoral. No entanto, o ministro Dias Toffoli ponderou: "Qual a
dificuldade da Polícia Federal em encaminhar um ofício ao Ministério
Público ou à Justiça Eleitoral fazendo essa requisição?". Procurada, a
PF disse que não iria se manifestar.
Para o juiz Marlon Reis, do Movimento de
Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), organização que propôs ao
Congresso a Lei da Ficha-Limpa após ampla coleta de assinaturas, a
decisão é equivocada e pode trazer prejuízo à apuração de
irregularidades nas eleições deste ano.
"O Ministério Público precisa de liberdade
para agir e deve ter poder de requisição de inquéritos. Assim é em todo
o âmbito da Justiça criminal e da apuração de abusos. Não faz sentido
que isso seja diminuído em matéria eleitoral. Pelo contrário, os poderes
deveriam ser ampliados, porque o MP atua justamente como fiscal da
aplicação da lei", critica.
Na visão do magistrado, a regra
introduzida pelo TSE este ano é inconstitucional, pois "cria uma
limitação ao MP que a Constituição não prevê". "O MP tem poderes para
requisitar inquéritos, inclusive exerce a função de controle externo da
atividade policial. Entendo que só com uma alteração constitucional se
poderia suprimir esses poderes", explica.
Além da questão legal, Reis avalia que a
resolução pode contribuir para abarrotar os escaninhos da Justiça
Eleitoral. "Em lugar de diminuir, isso vai aumentar o número de demandas
apresentadas diretamente ao Judiciário. Vai de encontro a alternativas
de agilização e de diminuição das ações", afirma.
O MCCE monitora abusos cometidos na
corrida pelo voto. Uma das principais preocupações em ano de eleições
gerais, como 2014, é a compra do apoio de lideranças políticas que
exercem influência sobre eleitores. "É a compra de votos no atacado",
exemplifica Marlon Reis.
cariri ligado
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