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domingo, 16 de dezembro de 2012

À beira do 'abismo fiscal', EUA precisam de acordo para evitar crise País precisa de acordo para evitar corte automático de gastos; entenda. EUA podem entrar em recessão e afetar economia mundial, inclusive Brasil.


Para não enfrentar um arrocho automático e caírem no “abismo fiscal”, os Estados Unidostêm até 31 de dezembro para decidir como cortar US$ 2,1 trilhões em gastos nos próximos dez anos e se vão manter as reduções de impostos definidas pelo governo Bush.
Homem vestido de Papai Noel faz discurso antes de entrar no Congresso os EUA para pedir acordo sobre o abismo fiscal antes do Natal. (Foto: Win McNamee/Getty Images/AFP)Homem vestido de Papai Noel discursa antes de entrar no
Congresso os EUA para pedir acordo sobre o abismo fiscal
antes do Natal. (Foto: Win McNamee/Getty Images/AFP)
Seja “aos 45 minutos do segundo tempo” (entre o Natal e o Ano Novo) ou já na prorrogação (nos primeiros meses do ano que vem), os especialistas acreditam que vai haver um acordo para definir o que vai ser cortado e de que forma. Ou seja, o país não vai descer muito fundo.
“Ninguém quer que o país entre no ‘abismo fiscal’, não é bom para a economia, é muita austeridade. Queremos reduzir gasto, mas da forma certa”, diz a economista Nela Richardson, da Bloomberg Government, especializada em análises de assuntos ligados ao governo americano. Segundo ela, há consenso também quanto à necessidade de uma reforma tributária.
Esse "abismo" é resultado da aprovação pelo Congresso, em 2011, da ampliação do déficit fiscal do país em US$ 2,1 trilhões. À época, o endividamento chegara ao limite de US$ 14,3 trilhões, e o país corria o risco de dar "calote" caso o limite da dívida não fosse elevado. Mas, em troca, a medida exigia chegar a um acordo até o fim de 2012 para cortar US$ 1,2 trilhão em dez anos. Sem isso, o tal “sequestro automático” de gastos que vão impactar programas sociais e de defesa seria ativado. É o que está prestes a ocorrer.
“O que estamos vendo agora é um mecanismo de segurança para forçar os congressistas a trabalharem juntos”, diz a economista da Bloomberg.
Há duas questões diferentes que vão diminuir o dinheiro em circulação nos EUA: 1) corte automático de US$ 1,2 trilhão em gastos do governo nos próximos dez anos, já que o limite máximo de endividamento (US$ 16,4 trilhões) está prestes a ser alcançado e 2) fim de medidas de redução de impostos que vêm desde o governo Bush, sem as quais os americanos vão pagar mais impostos e receber menos benefícios.
Para o ano que vem, calcula-se que o corte será de cerca de US$ 500 bilhões, somados benefícios que vão expirar e os cortes de gastos do governo. Esse dinheiro a menos deve fazer a economia frear já em 2013, segundo os analistas.
Tamanho do possível corte de gastos e aumento de impostos em 2013, em US$ bilhões
Total de aumento nos impostos427
Total dos cortes de gastos127
TOTAL RETIRADO DA ECONOMIA554
AcordoBarrar o ‘abismo’ (esse corte grande e todo de uma vez) depende de os líderes do Congresso dos EUA definirem juntos o que cortar. Havendo um consenso para reduzir os tais US$ 1,2 trilhão nos próximos dez anos, o abismo some e os cortes passam a ser escalonados. É aí que está o problema.
As tentativas de negociação vêm pelo menos desde agosto, mas as discussões não têm sido muito frutíferas. Obama quer elevar os impostos dos americanos mais ricos e os republicanos, liderados por John Boehner, discordam por achar que isso irá impedir o crescimento das empresas, resume a revista americana “Forbes”.
Consequências
Enquanto não se sabe que lado vai perder na definição dos cortes, a economia perde como um todo, já que a indefinição gera prejuízo à economia, diz a economista Nela Richardson. “É como no Brasil, em que investimentos estão sendo retidos por conta da insegurança. Essa indefinição é ruim para o país e é o que vai prejudicar nossa economia”, diz, apontando como possível consequência a alta do desemprego pré-abismo.
A indefinição é ruim para o país e é o que vai prejudicar nossa economia”
Nela Richardson, economista da Bloomberg Government
Os desdobramentos da queda no abismo, por outro lado, podem ser catastróficos ou apenas ruins, dependendo da análise. Os mais pessimistas acreditam que o corte fará a economia dos EUA escorregar no início da escalada de recuperação, levando abismo abaixo a fraca economia mundial.
Para o Escritório de Orçamento do Congresso (CBO, na sigla em inglês), o desemprego deve subir de 7,7% em novembro para 9% e o país deve entrar em recessão, encolhendo 0,5% até o fim de 2013.
Entre os principais cortes estão o de verbas para o programa de saúde do governo, o Medicare; do auxílio-desemprego; e do orçamento de defesa. No total, mais de US$ 100 bilhões devem ser enxugados, segundo o CBO e a MB Associados.
O fim dos descontos em impostos a empresas e cidadãos deve retirar aproximadamente outros US$ 400 bilhões da economia – via tributos mais altos e menos benefícios sociais. Estão à beira de expirar, por exemplo, a redução de alíquotas de imposto de renda e as desonerações sobre contratações.
A consequência deve ser a redução de consumo principalmente nas classes médias e baixas. “Qual a conta dos economistas e do mercado? Se não for negociada a extensão da redução de impostos, eles vão subir para as pessoas físicas e empresas e isso vai significar retirada de dinheiro da economia: famílias vão ter de pagar ao governo e não vão consumir com esse dinheiro”, diz o professor do curso de relações internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Geraldo Zahran.
CONSEQUÊNCIAS DO ABISMO FISCAL
Alta do desemprego: de 7,7% (em novembro) para 9% em 2013
Recessão: encolhimento de 0,5% no PIB em 2013
Principais cortes de verbas: programa de saúde do governo, o Medicare; auxílio-desemprego; e orçamento de defesa.
Incentivos tributários à beira de expirar: redução de alíquotas de imposto de renda e desonerações sobre contratações.
Para o Brasil: redução de exportações para os EUA, queda da Bovespa e desvalorização do dólar.
A queda pode chegar ao Brasil trazendo a redução de exportações para os EUA, queda da Bovespa e desvalorização do dólar, segundo analistas. Um encolhimento da economia norte-americana reduziria nossas vendas tanto para os EUA quanto para outros países que comercializem com ele como a China – nosso principal parceiro comercial. A recessão nos EUA “pode limitar as medidas recentes realizadas no câmbio pelo governo no intuito de aumentar a competitividade da nossa indústria”, diz o economista da MB Associados, Antônio Louro.
Já os menos pessimistas lembram que o corte de US$ 1,2 trilhão não atingirá a economia de forma instantânea – ou seja, haveria mais tempo para o acordo. “Se as leis entrarem em vigor, a economia pode começar um declínio que pode levar a uma recessão em 2013, mas isso é bem distante de cair num abismo, diretamente numa recessão”, diz Chad Stone, economista-chefe do Centro de Orçamento e Políticas Prioritárias (CBPP, na sigla em inlgês), no artigo “Medo equivocado do ‘abismo fiscal’ impõe desafios a negociações do orçamento”.
Stone e o CBO apontam que o impacto imediato na renda da maioria das famílias será limitado a um aumento nos impostos proporcional ao salário. Isso trará impactos negativos, mas não uma crise como a Depressão de 1929, só uma leve recessão.
Limite de gasto
O tal gatilho de corte de gastos existe porque o endividamento do governo americano é limitado pelo Congresso, uma forma de proteger a economia e os cidadãos de gastos excessivos.
No governo Clinton (entre 1993 e 2001), o limite de endividamento era de US$ 5,5 trilhões. Foi na era Bush e Obama que ele subiu tanto, até chegar aos atuais US$ 16,4 trilhões"
Geraldo Zahran, professor do curso de relações internacionais da PUC-SP
"A razão entre a dívida e o PIB não pode aumentar eternamente. Se isso acontece, as reservas nacionais disponíveis para investimento privado encolhem e, em uma situação extrema, reduzem o crescimento e, como consequência, o nível de vida da população”, escreve Richard Kogan, do CBPP, no artigo “Economia de US$ 2 trilhões no déficit alcançaria alvo chave: estabilizar a dívida na próxima década”. No caso de uma futura crise, ficaria mais difícil conseguir investimentos e o preço, maior.
“Para se ter uma ideia, no governo Clinton (entre 1993 e 2001), o limite de endividamento era de US$ 5,5 trilhões. Foi na era Bush e Obama que ele subiu tanto, até chegar aos atuais US$ 16,4 trilhões”, explica Zahran, do curso de relações internacionais PUC-SP. Atualmente, diz a revista “Forbes”, o endividamento dos EUA é de 70% do PIB, a taxa mais alta em mais de 70 anos.
Para o cenário de crescimento seria importante a manutenção de alíquotas mais baixas, mas do ponto de vista do endividamento público o aumento de impostos é mais do que providencial (cortá-las)"
Antonio Louro, economista da MB Associados
O que e como cortar
Mas se há consenso de que é preciso cortar gastos e fazer uma profunda reforma tributária para reduzir os impostos, além de ser perceptível que a demora em decidir aumenta o prejuízo, por que o Congresso não toma uma decisão?
“A culpa é do Congresso”, diz a economista da Bloomberg Government, bem-humorada. “Há mais consenso entre os partidos que divergências, mas as que existem são realmente centrais.”
Cada partido defende os interesses de sua base eleitoral, democratas e republicanos não abrem de minimizar o peso dos gastos para uma parte específica da população. “O que está entravando as discussões é menos técnico e mais político. Eles relacionam o pagamento de impostos com cidadania, tanto que na campanha eleitoral se fala em 'pagador de impostos'”, diz o coordenador do curso de economia internacional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Antonio Carlos Alves dos Santos.
As alíquotas sobre a renda, hoje entre 10% a 35%, vão voltar para o patamar entre 15% e 39,6% se não houver acordo. “Barack Obama quer permitir o aumento dessas alíquotas, mas somente para a faixa mais rica da população. Para o cenário de crescimento seria importante a manutenção dessas alíquotas, mas do ponto de vista do endividamento público o aumento de impostos é mais do que providencial (cortá-las), diz o economista Antônio Louro.
Quando cortar
Os mais otimistas apostam que um acordo será fechado entre o Natal e o Ano Novo, a exemplo do que ocorreu em 2011. A decisão só veio em 31 de julho, último dia, mesmo com a nota de risco do país tendo sido reduzida e a emissão de títulos para financiar mais gastos bloqueada.
“Seria ótimo que houvesse um acordo entre Natal e Ano Novo. Acho que ele vai ocorrer, mas talvez só em fevereiro. Ate lá, a economia não está fazendo muitos avanços nem fará”, prevê Nela. Na análise de Chad Stone, do CBPP, a decisão pode sair só em abril. 
.globo.com

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